Do Cafofo do Dezena - Crônica Viva - O Máximo Possível
Antes de começar a crônica, tive de desvirar um quadro. Não, não estava na parede, mas no Cafofo, encostado em uma pilha de livros.
Há dias está assim, só agora me incomodou. Veio-me a certeza de que não conseguiria escrever com a torre da igreja apontando para o centro da terra. Alguns sabem, mas conto a todos: sou um aspirante a pintor. Descobri um meio de passar longas horas sem pensar em nada. Faço os riscos na tela e, com calma, misturo as tintas e borro as partes brancas. Sim, por enquanto é isso que sei fazer. De tudo, às vezes, acerto e surge algo que se pode colocar na parede. O problema maior é esse. Não tenho tantas paredes para a minha volúpia criativa e sinto que a Luciane está perdendo a boa vontade inicial. Por isso, ele está lá, quieto, em um canto, de cabeça para baixo. Pronto, levantei e arrumei, agora posso pensar na crônica para este domingo.
Logo que a publicar, vou correr. Dez quilômetros, pela manhã, garantem um dia prazeroso, ainda mais nesta época do ano, quando o sol brilha desde a madrugada. Tenho me dedicado muito, bati meu recorde pós-pandemia na semana passada. Consegui baixar de sete minutos, o quilômetro. Para uma pessoa que carrega uma barriguinha em volume, é um tempo extraordinário. Ouvi da Fernanda Montenegro, uma frase importantíssima (achei adequado o superlativo). Família que sempre esteve em alta, agora, depois do filme Ainda estou aqui, reluziu. Disse: Aprendi a ser o máximo possível de mim mesma! A utilização do verbo ser deu um charme à construção e a palavra possível nos traz algo de palpável, humano. Por isso, quando estou correndo, lembro-me da lição e acredito ser possível acelerar um pouco mais. Na literatura, a mesma coisa, no trabalho e no amor. Nessa família só tem Pelé, não é verdade? Sempre se ganha em acompanhá-la.
Voltei a olhar para o quadro, sério. Ele está bonitinho do jeito que deixei. Acontece que fico procurando algum desajuste para melhorar. Como em um texto literário, a pintura pronta segue o processo. Revisitamos para melhorá-la. Ouvi dizer, não me perguntem o nome, que um pintor corria os museus e retocava seus quadros com pequenas pinceladas. Quem, em um texto escrito, publicado, não gostaria, tempos depois, de dar uma mexidinha? Acho que aí também se enquadra, sem trocadilho, ser o máximo possível de nós mesmos.
 
Fernando Dezena
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Logo que a publicar, vou correr. Dez quilômetros, pela manhã, garantem um dia prazeroso, ainda mais nesta época do ano, quando o sol brilha desde a madrugada. Tenho me dedicado muito, bati meu recorde pós-pandemia na semana passada. Consegui baixar de sete minutos, o quilômetro. Para uma pessoa que carrega uma barriguinha em volume, é um tempo extraordinário. Ouvi da Fernanda Montenegro, uma frase importantíssima (achei adequado o superlativo). Família que sempre esteve em alta, agora, depois do filme Ainda estou aqui, reluziu. Disse: Aprendi a ser o máximo possível de mim mesma! A utilização do verbo ser deu um charme à construção e a palavra possível nos traz algo de palpável, humano. Por isso, quando estou correndo, lembro-me da lição e acredito ser possível acelerar um pouco mais. Na literatura, a mesma coisa, no trabalho e no amor. Nessa família só tem Pelé, não é verdade? Sempre se ganha em acompanhá-la.
Voltei a olhar para o quadro, sério. Ele está bonitinho do jeito que deixei. Acontece que fico procurando algum desajuste para melhorar. Como em um texto literário, a pintura pronta segue o processo. Revisitamos para melhorá-la. Ouvi dizer, não me perguntem o nome, que um pintor corria os museus e retocava seus quadros com pequenas pinceladas. Quem, em um texto escrito, publicado, não gostaria, tempos depois, de dar uma mexidinha? Acho que aí também se enquadra, sem trocadilho, ser o máximo possível de nós mesmos.
 
Fernando Dezena
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